Educação Especial e Economia Solidária

Autora: Thais Aparecida Godoy de Souza
Orientadora: Profª. MSª. Regina Soares de Oliveira

Aos meus familiares pelo apoio constante em meu trabalho
e em tudo que me propus em minha vida.
A minha aluna Maria da Silva, que me mostrou em sua pequena passagem
por essa vida a importância de acreditar que nossos problemas são pequenos…
Seu sorriso estará sempre em meu coração…

DEFICIÊNCIAS

“Deficiente” é aquele que não consegue modificar sua vida, aceitando as imposições de outras pessoas ou da sociedade em que vive, sem ter consciência de que é dono do seu destino.
“Louco” é quem não procura ser feliz com o que possui.
“Cego” é aquele que não vê seu próximo morrer de frio, de fome, de miséria, e só tem olhos para seus míseros problemas e pequenas dores.
“Surdo” é aquele que não tem tempo de ouvir um desabafo de um amigo, ou o apelo de um irmão. Pois está sempre apressado para o trabalho e quer garantir seus tostões no fim do mês.
“Mudo” é aquele que não consegue falar o que sente e se esconde por trás da máscara da hipocrisia.
“Paralítico” é quem não consegue andar na direção daqueles que precisam de sua ajuda.
“Diabético” é quem não consegue ser doce.
“Anão” é quem não sabe deixar o amor crescer.
E, finalmente, a pior das deficiências é ser miserável, pois:
“Miseráveis” são todos que não conseguem falar com Deus.
“A amizade é um amor que nunca morre.”

Mario Quintana (escritor gaúcho nascido em 30/07/1906 e morto em 05/05/1994

SUMÁRIO

  • Introdução
  • Um pouco sobre as deficiências
    Deficiência Intelectual
    Paralisia Cerebral
    Autismo
  • Relação  entre  o  trabalho  com   alunos  deficientes  e  alguns   princípios   da economia
    solidária
  • Práticas Pedagógicas
  • Conclusão
  • Bibliografia

 

INTRODUÇÃO

O trabalho de mosaico com os alunos com necessidades educacionais especiais do CIEJA Aluna Jéssica Nunes Herculano surgiu no decorrer do curso de especialização de Educação de Jovens e Adultos e Economia Solidária no ano de 2011, ministrado pela Universidade Federal do ABC – Santo André. A ideia era desenvolver uma atividade em que os alunos pudessem a partir da atividade desenvolvida, compreender e relacionar alguns conceitos simples da economia solidária.

Ao se falar em respeito e valorização a diversidade humana, não se pode considerar apenas a inserção desse cidadão com necessidade especial no ambiente escolar, espaço esse que vem se adaptando aos poucos para o recebimento e desenvolvimento do trabalho desse aluno, mas também na sociedade como um todo. Por isso deve-se ter claro que esses valores devem ultrapassar os muros da escola, ou seja, que a mundo atual também se adapte a todas essas transformações, possibilitando condições de conquistas pedagógicas e conquistas pessoais, que lhe permitam acesso a todos os direitos dos cidadãos.

Inserir esse aluno no convívio social é um dos objetivos da inclusão. Nessa convivência ele poderá ser o escritor da própria história, conquistando sua autonomia e autoconfiança. Trabalhar as limitações e potencialidades de cada aluno é o ponto essencial para um caminho de descobertas e avanços, com desafios que possibilitem seu desenvolvimento na sociedade, na escola, em casa e no trabalho.
O CIEJA (Centro Integrado de Educação de Jovens e Adultos) Aluna Jéssica Nunes Herculano está localizado na região do Butantã e atende alunos que por diversas razões não concluíram os estudos de 1ª a 8ª séries na idade escolar. As aulas ocorrem todos os dias com duração de 2 horas e 15 minutos e em seis horários diferentes: 7h30, 10h, 12h45, 15h15, 17h30 e 20h. E são divididas em módulos:

  • Módulo I – 1ª e 2ª séries
  • Módulo II – 3ª e 4ª séries
  • Módulo III – 5ª e 6ª séries
  • Módulo IV – 7ª e 8ª séries

Em 2011 trabalhei como professora de SAAI (Sala de Apoio e Acompanhamento a Inclusão) em parceria com os professores das salas regulares. Um dos objetivos da SAAI é acompanhar e discutir os aspectos pedagógicos apresentados, para que se façam as adaptações necessárias no currículo em relação a cada aluno (o trabalho é direcionado individualmente), trabalhando suas potencialidades e dificuldades, tais como: organização, comportamento, socialização, realização de atividades de vida diária e outros pontos apresentados pelos professores, buscando sempre autonomia em seu desenvolvimento.

Nesse ano ocorreram 53 matrículas de alunos com necessidades educacionais especiais. Além da inclusão de todos nas classes regulares, 30 foram acompanhados por mim na SAAI, sendo 11 do sexo feminino e 19 do sexo masculino, com faixa etária variada, dos 16 aos 55 anos. A maioria desses alunos tinha deficiência intelectual, porém havia casos com autismo, paralisia cerebral e sequela de acidente vascular cerebral (AVC).
Esse acompanhamento ocorria antes ou depois do horário das aulas regulares, e em alguns casos, apenas em sala de aula (respeitando a especificidade da deficiência).

Na SAAI eram formados pequenos grupos para o desenvolvimento do trabalho, divididos a partir dos seguintes critérios: graus de dificuldade e afinidade, horário das aulas em classe regular, situação de cada aluno – o limite que ele conseguia se concentrar e situações particulares (como uso de fralda e comportamentos exacerbados – sem controle para o trabalho em grupo).

Apresento os objetivos do Projeto de Mosaico que foi desenvolvido com os alunos com necessidades educacionais especiais:

  • desenvolver a percepção na transformação do espaço com o trabalho realizado por eles;
  • estimular aspectos de atenção, concentração e percepção;
  • aprimorar o trabalho com formas e desenhos;
  • estimular o trabalho para o uso de diferentes cores e seus contraste;
  • possibilitar o uso de diferentes materiais e técnicas para desenvolver novas habilidades.

Uma questão encontrada durante o processo foi à descrença de algumas famílias nas habilidades que seus filhos demonstram, muitas vezes enfatizam suas limitações e dificuldades e não acreditam que o mesmo pode se desenvolver com as capacidades que apresentam. Entender que o aprendizado está além do ato de ler e escrever é difícil para muitos, isso devido à forma como a educação foi construída e estabelecida na sociedade (uma questão histórica). Essa é a fala que encontrei em muitas conversas com as famílias, que acreditam que o aprendizado só depende disso, ler e escrever, e que se isso não ocorre da forma convencional, comparando com os demais estudantes, o filho não “sabe nada”.

Cada pessoa é única e tem seu próprio ritmo de desenvolvimento. É importante não estabelecer comparações entre os estudantes, pois todos se desenvolvem. O que se precisa entender é que as pessoas são diferentes, assim como os níveis da deficiência e as formas como criam vínculos com o aprendizado. Respeitar esse tempo para a construção e estabelecimento da aprendizagem é essencial para que suas habilidades e competência sejam alcançadas.

É fundamental investir e acreditar nas potencialidades desses alunos para darem continuidade a seus estudos e sonhos, mostrando a todos, e principalmente as famílias, que são capazes de se desenvolverem e que o que mais necessitam é de atenção e apoio para terem oportunidades de concretizarem seus sonhos. Acreditar é o que permite que qualquer trabalho tenha seu sentido.

UM POUCO SOBRE AS DEFICIÊNCIAS

Apresento nesse capítulo uma síntese sobre as deficiências que foram encontradas no Centro Integrado de Educação de Jovens e Adultos Aluna Jéssica Nunes Herculano no ano de 2011.

Entender um pouco sobre a parte biológica dos alunos que participaram desse trabalho ajuda a compreender o porquê apresentaram certas dificuldades e limitações em alguns pontos do trabalho e também, como as particularidades da deficiência podem interferir no processo de aprendizagem.

A Prefeitura de São Paulo desenvolve um trabalho de inclusão nas escolas que cresce a cada ano, possui uma equipe nas Diretorias de Ensino que é responsável pelo acompanhamento desses alunos no ambiente escolar bem como o acompanhamento das professoras de SAAI (Sala de Apoio e Acompanhamento a Inclusão). As professoras de SAAI só podem atuar nessas salas se tiverem em sua formação alguma especialização na área de educação especial.

As salas são divididas pelas especialidades: SAAI de Deficiência Intelectual; SAAI de Deficiência Auditiva; SAAI de Deficiência Visual e SAAI de Deficiência Física.

O Setor responsável acompanha mensalmente os professores de SAAI, com reuniões, formações nas diversas áreas de deficiência, estudos de caso, aproximando o professor da sala regular com o professor da SAAI, favorecendo assim, o processo de inclusão entre todos os participantes da Unidade Escolar.

A maioria dos alunos com necessidades educacionais especiais realiza seu acompanhamento médico na Unidade Básica de Saúde (UBS) mais próxima a sua residência, e em alguns casos, são encaminhados a tratamentos mais específicos, como psicólogo, psiquiatria e terapia ocupacional, onde passam por consultas mensalmente ou bimestralmente.

Em toda a rede, a deficiência com maior número de casos é a intelectual, e em alguns casos a intelectual sempre vem associada a mais alguma deficiência, o que leva a deficiência múltipla, como a baixa visão com a deficiência intelectual; a deficiência física com a intelectual entre outras formas que ela pode vir a se apresentar.

A equipe de profissionais e as famílias, em conjunto, devem traçar os mesmos objetivos para que o processo de desenvolvimento da pessoa com deficiência ocorra, buscando caminhos para que às adaptações necessárias em todos os aspectos (espaços, locomoção, currículo escolar) se tornem concretas e a aceitação da deficiência na sociedade seja um assunto superado.

A seguir, explico um pouco sobre as deficiências encontradas no CIEJA Aluna Jessica Nunes Herculano.

Deficiência Intelectual

A deficiência intelectual não é uma doença e não é contraída a partir do contágio com outras pessoas. Deficiência Intelectual é um termo usado para a pessoa que apresenta algumas limitações nos seguintes aspectos:
mental;
comunicação;
no cuidado pessoal;
no relacionamento social.
Sua manifestação se dá antes dos 18 anos e a identificação pode ocorrer pelo atraso no desenvolvimento neuro-psicomotor, onde a criança pode apresentar as seguintes características:

  • demora para firmar a cabeça;
  • atraso para sentar-se;
  • atraso para andar;
  • atraso para falar;
  • dificuldades no aprendizado escolar;
  • dificuldades no aprendizado de atividades de vida diária, podem levar um pouco mais de tempo para compreenderem as competências necessárias para o cuidado pessoal.

Para que se suspeite que a criança tenha alguma deficiência, é necessário que se encontre vários aspectos em seu desenvolvimento, um único não pode ser considerado como indicativo para a confirmação da deficiência.

Muitas vezes a pessoa com deficiência intelectual enfrenta dificuldades no período escolar, isso ocorre tanto pelo formato das escolas atuais, que impede que esse aluno participe do processo de aprendizagem como os demais colegas, quanto pelas dificuldades e limitações que a deficiência gera. Mas isso não impede que venham a aprender, apenas necessitam de mais tempo e condições necessárias para que possam se desenvolver, e como qualquer outra pessoa, pode aprender determinadas coisas e outras não ter tanto retorno sobre a aprendizagem.

A seguir, cito as causas mais comuns da deficiência intelectual:

  • Genéticas: o atraso mental é causado por genes anormais herdados dos pais; por erros ou acidentes produzidos na altura em que os genes se combinam; ou por outras razões de natureza genética (Síndrome de Down).
  • Pré-natais: doenças infecciosas durante a gestação (rubéola, sarampo, sífilis e herpes) que causam malformações cerebrais durante o período embrionário (referente aos 3 primeiros meses).
  • Perinatais: anoxia (ausência de oxigênio) e asfixia (supressão ou retardamento da respiração e da circulação do sangue) por obstrução do cordão umbilical, pela anestesia em quantidade excessiva, pelo parto prolongado, prematuridade e hipermaturação.
  • Pós-natais: ocorrem durante a maturação do sistema nervoso, aproximadamente durante os 3 primeiros anos de vida, como por exemplo, meningite, encefalite, traumatismo na cabeça, acidentes anestésicos, desidratações, transtornos vasculares e intoxicações. (COLL, MARCHESI, PALACIOS & COLS, 2004, p. 219-221)

Nenhum destes aspectos citados, por si só, determinam a deficiência intelectual, no entanto, constituem riscos, uns mais sérios e outros com menos gravidade para que ela ocorra. Por exemplo, a meningite não provoca necessariamente um atraso intelectual, isso dependerá do grau da doença; o consumo excessivo de álcool durante a gravidez também não; mas todas essas causas constituem riscos graves.

Para o desenvolvimento da pessoa com deficiência intelectual, todos os envolvidos no processo devem incentivá-lo a buscar sua independência que permitirá conseguir maior autonomia, atribuir-lhe tarefas que trabalhe responsabilidade, ajudar em situações que não consiga solucionar por mais simples que seja, e que com a ajuda, terá a oportunidade de aprender como resolver, relacionar as competências e habilidades desenvolvidas na escola com as atividades que realiza em casa, trabalhar em parceria com os profissionais que o acompanham e sempre elogiar tudo que conseguir realizar.

Paralisia Cerebral

O termo paralisia cerebral (PC) é usado para descrever uma condição de ser, definindo a desordem caracterizada por alteração do movimento. Cada área do cérebro é responsável por uma determinada função, pois o cérebro é responsável por todas as funções do corpo, como os movimentos dos braços e pernas, a visão, a audição e a inteligência.

A Paralisia Cerebral é uma alteração ou alguma perda do controle motor causada por uma lesão encefálica ocorrida no pré-natal ou durante a primeira infância que leva a sintomas diversos e prognósticos variados.

Dependendo da lesão e da quantidade de células afetadas, diferentes partes do corpo podem ser prejudicadas, o que leva a alteração do tônus muscular, da postura e pode provocar dificuldades nas funções dos movimentos.

As alterações que podem ocorrer em uma pessoa com paralisia cerebral podem ser:

  • falta de coordenação dos movimentos;
  • falta de habilidade para a fala;
  • falta de habilidade para comer;
  • maneira diferente para andar (“desajeitadas” ao caminhar);
  • maneira diferente de segurar objetos;

A pessoa que possuí uma lesão cerebral mais grave pode apresentar:

  • incapacidade motora acentuada;
  • impossibilidade no falar;
  • impossibilidade no ato de andar – ser totalmente dependente para todas atividades da vida cotidiana;
  • comprometimentos cognitivos.

A Paralisia cerebral não é uma doença como muitos acreditam, é uma condição médica, um estado patológico que pode ocorrer antes, durante ou logo após o parto, isso resulta da falta de oxigenação do cérebro em algum desses momentos.

O importante é entender que a pessoa com Paralisia Cerebral só terá uma alteração em sua parte cognitiva se a lesão afetar algum campo cerebral responsável pelo pensamento e pela memória, o que trará problemas em relação ao desenvolvimento da parte cognitiva do mesmo.
Apresento a seguir as principais causas da Paralisia Cerebral:

  • Pré-natais: doenças infecciosas como rubéola, sarampo, sífilis e intoxicação intra-uterinas; exposição ao raio X nos primeiros meses de gravidez; incompatibilidade entre Rh da mãe e do pai e mãe com diabetes ou com toxemia de gravidez (intoxicação resultante do excesso de toxinas acumulada no sangue); pressão alta da gestante.
  • Perinatais: falta de oxigenação no momento do parto (o bebê demora para respirar, podendo causar lesão em partes do cérebro); partos demorados; partos difíceis que geram lesões; uso inadequado do fórceps e manobras obstétricas violentas.
  • Pós-natais: desidratação, com muita perda de líquidos; envenenamento por gás, por chumbo; falta de oxigênio por afogamento ou outras causas; febre alta e prolongada; ferimento ou traumatismo na cabeça; infecções cerebrais causadas por meningite ou encefalite; sarampo e traumatismo crânio-encefálico (até os três anos de idade).

O desenvolvimento da pessoa com Paralisia Cerebral pode ocorrer normalmente durante sua vida, necessitando apenas de recursos aprimorados como o uso da tecnologia – computadores e aparelhos informatizados que o ajude no desenvolvimento da aprendizagem. Limitações em seu dia-a-dia são encontradas, tanto na parte da falta de estrutura física como na falta de informação das pessoas, que muitas vezes por preconceito, impedem o desenvolvimento da mesma. Adaptações são sempre necessárias para suas conquistas em tudo o que for fazer.

Autismo

O Autismo apresenta-se por uma desordem na qual a pessoa tem dificuldades na interação social, alterações na linguagem e alterações de comportamento. A etiologia (causa) do autismo ainda não foi encontrada mesmo com muitas pesquisas realizadas na área. É uma patologia diferente da deficiência intelectual ou da lesão cerebral e se manifesta antes dos três primeiros anos de idade. É mais freqüente em meninos do que em meninas, suas manifestações variam de caso para caso devido às diferenças individuais do quadro clínico e o diagnóstico é feito a partir da observação do comportamento da criança.

“Apresentou-se como um mundo distante, estranho e cheio de enigmas.” (COLL, MARCHESI, PALACIOS & COLS 2004 p. 234)

A pessoa com autismo pode apresentar as seguintes atitudes:

  • demonstra estar distantes do mundo real;
  • se comporta de modo compulsivo e ritualista;
  • insistência a repetição;
  • tem dificuldade para fixar o olhar;
  • não gosta de estar em contato com outras pessoas;
  • age como se fosse surdo;
  • apresenta apego a objetos como ponto de conforto (exemplo: livros);
  • não reconhece o perigo;
  • apresenta risos e movimentos inapropriados;
  • acentuada hiperatividade física (em 50% dos casos);
  • usa as pessoas como ferramenta para conseguir o que quer;
  • evita abraços;
  • comportamento muitas vezes arredio;
  • apresenta atraso ou até a ausência da fala;
  • resistente a mudanças possuindo vínculo com a rotina, como por exemplo, o caminho para a escola;
  • cria regras para sua vida e as realiza sozinho;
  • atitudes inesperadas e diferenciadas do que é considerado normal pela sociedade.

A demora no processo de diagnóstico e aceitação é prejudicial ao desenvolvimento e resultados positivos no tratamento, uma vez que a identificação precoce deste transtorno global do desenvolvimento (TGD) permite um encaminhamento adequado e influência significativa na evolução da criança.

O quadro de autismo não é estático, alguns sintomas podem modificar-se, outros podem amenizar-se ou até desaparecer, porém, outras características poderão surgir com a evolução do indivíduo. Assim, é necessário avaliações periódicas para esse acompanhamento e controle dos sintomas.

É fundamental o investimento no ser humano com autismo, toda a intervenção realizada trará benefícios significativos e que se estenderá para toda sua vida.

RELAÇÃO ENTRE O TRABALHO COM ALUNOS DEFICIENTES E ALGUNS PRINCÍPIOS DA ECONOMIA SOLIDÁRIA

A escolha do trabalho de mosaico iniciado no ano de 2011 com os alunos com necessidades educacionais especiais do CIEJA teve como princípio desenvolver uma atividade que pudesse desdobrar também em uma forma de trabalho, buscando aprimorar maneiras de aprendizado diferentes onde pudessem desenvolver autonomia, criatividade, técnicas e novas relações entre eles. Foram estimulados a: colaborar, tomar decisões, fazer escolhas e a ter novas relações com o espaço que viviam, percebendo assim as transformações que poderiam fazer sempre com conceitos que norteiam a Economia Solidária.

“A economia solidária é outro modo de produção, cujos princípios básicos são a propriedade coletiva ou associada do capital e o direito à liberdade individual.” (SINGER, 2002 p. 10)

Durante as atividades em SAAI, percebi que a interação dos alunos foi modificando com o passar das aulas, foram capazes de desenvolver um grande sentimento de colaboração nos momentos das construções dos mosaicos, e nesse sentido, foi possível perceber a relação com a Economia Solidária, uma vez que esta proporcionou um trabalho coletivo, momento em que todos participam e se colocam como agentes desse processo, atitudes que levam ao fortalecimento do grupo e que permite se pensar no coletivo.

Essas atitudes se mostravam em pequenos atos, mas que estando diariamente com eles, se tornavam enormes. O momento em que paravam de fazer sua atividade e iam ajudar o colega a colocar mais cola no pote, pois o colega, devido a sua deficiência e seu comprometimento motor não conseguia realizar essa tarefa. Outro momento era um aluno que estava com dificuldade na disposição da colagem das peças, e que, outro aluno o ajudava com sugestões na decisão das cores e formas a serem usadas.

A Economia Solidária é uma forma inovadora de desenvolvimento sustentável com geração de trabalho e distribuição de renda a favor da inclusão social, apresentando-se como uma alternativa de maior autonomia e democratização do trabalho, onde se produz, vende, compra e troca objetos, alimentos, coisas necessárias para se viver. Isso deve sempre ocorrer sem a exploração das pessoas em seus trabalhos, e também, sem a deteriorização do meio ambiente, que fornece muito a sociedade e sendo bem cuidado, sempre dará seu retorno.

“A construção da economia solidária é uma destas outras estratégias. Ela aproveita a mudança nas relações de produção provocada pelo grande capital para lançar os alicerces de novas formas de organização da produção, à base de uma lógica oposta àquela que rege o mercado capitalista. Tudo leva a acreditar que a economia solidária permitirá, ao cabo de alguns anos, dar a muitos, que esperam em vão um novo emprego, a oportunidade de se reintegrar à produção por conta própria individual ou coletivamente…” (SINGER: 2000 p. 138).

Sabe-se que as práticas econômicas e sociais são organizadas por forma de cooperativas, feiras de troca e empresas autogestionárias. Durante a construção das peças para o mosaico, houve sempre um trabalho centrado na valorização do ser humano, trabalho esse que buscou valorizar o que cada um produzisse e suas conquistas em seu desenvolvimento. Isso possibilitou uma nova relação de trabalho, de forma democrática. Tudo isso ocorreu no “microcosmo”, um pequeno grupo, onde os conceitos sobre ECOSOL foram demonstrados em suas atitudes durante o processo. Cada aluno com seu grau de entendimento compreendeu um pouco sobre a economia solidária.

“Se toda economia fosse solidária, a sociedade seria muito menos desigual.” (SINGER, 2002 p. 10)

As seguintes características da Economia Solidária, foram observadas no desenrolar das atividades como a cooperação – interesses e objetivos em comum; a autogestão – todos participantes exerceram no processo de trabalho as práticas da autogestão, ocorreu de uma forma muito simples, mas puderam sim ter esse momento de autogestão; solidariedade – justa distribuição dos resultados do trabalho, sem distinção de gênero, idade e raça, oportunidades que levam ao desenvolvimento da capacidade e da melhoria das condições de vidas das pessoas.

“A empresa solidária se administra democraticamente, ou seja, pratica a autogestão.” (SINGER, 2002 p. 18)

Na autogestão, os participantes envolvidos cumprem suas funções e são responsáveis também pelos problemas gerais da empresa, onde todos estão a par de tudo que ocorre e assim, juntos, podem encontrar soluções para os problemas que vierem a surgir.

Desde o início da atividade, tudo era decidido em conjunto, as peças, as formas, as cores das pastilhas, mesmo que depois focassem em apenas uma peça. Todos alunos que participaram, independente da deficiência, conseguiram compreender de certa forma sobre o processo do mosaico, tiveram autonomia para a construção bem como a organização do material. Cada um buscava sua peça e assim trocava idéias com os colegas, uns com mais independência, outros com ajuda dos colegas ou minha. Na Empresa Solidária todos participantes sabem sobre todos os assuntos que acontecem em todas as frentes e as alternativas disponíveis para a resolução de cada problema.

Na economia solidária, o trabalho deve ser realizado de forma igualitária entre todos os participantes. No entanto, os alunos de SAAI são por naturezas diferentes, como qualquer pessoa, alguns aspectos de sua deficiência pode alterar o ritmo de trabalho ou a percepção da realidade, mas nada impede que se desenvolva. Consegui com o grupo aproximar dos ideais mais simples da economia solidária, como o trabalho de cooperação, a transformação do espaço com o próprio trabalho, autogestão e a solidariedade entre eles.

Uma outra proposta era realizar uma feira de troca entre eles, onde pudessem trocar uma de suas peças com seus colegas, pois foi um trabalho coletivo, e nesse momento, poderiam compreender o que e como acontece uma feira de troca, mesmo que a mesma ocorresse somente com as peças de mosaico. Isso não ocorreu pelo fato da escola ter entrado em reforma e o calendário ter sofrido algumas alterações.
Apresento a seguir as práticas ocorridas durante o processo de construção do mosaico.

A primeira foi escolhida devido a situação que muitos dos alunos chegam ao CIEJA, sem noções simples para o desenvolvimento dos conteúdos básicos trabalhados no currículo escolar, como por exemplo cores, letras, formas geométricas entre outras. Devido a essa situação, iniciei desenvolvendo conceitos básicos para alfabetização baseado em formas e cores.

A segunda prática, que foi o processo de construção do mosaico, desenvolvido para trabalhar as atividades onde os alunos pudessem apreender e compreender parte por parte e assim, com suas peças, perceber a transformação do espaço que frequentam.

PRÁTICAS PEDAGÓGICAS

 

CONCLUSÃO

A Economia Solidária deve ser entendida em sua concepção como um elemento de fomento à emancipação do ser humano, pois busca uma inserção no mercado produtivo e consumidor, com a manutenção no seio dos empreendimentos de valores democráticos de produção, baseados nos princípios da cooperação, do voto único por associado independente do capital integralizado, da autogestão, da equidade, entre outros.
As relações na Economia Solidária devem ser entendidas como uma forma de emancipação do indivíduo e de “confronto” aos princípios do modo de produção capitalista. Entender que seus ideais vão muito além do que é proposto pelo capitalismo como conhecemos é o mais importante para se acreditar que a Economia Solidária é possível de acontecer e sobreviver na sociedade que encontramos.

Com esse trabalho, pude concluir que todos os alunos com necessidades educacionais especiais podem encontrar com suas habilidades, da mais simples para a mais complexa, uma nova maneira de se desenvolver. Trabalhando com eles uma nova forma de atividade na área do artesanato, pude entender que como nós também temos nossas preferências no que gostamos, eles também agem como todos. Isso concluo pois tenho alunos que não conseguem se desenvolver nas atividades do currículo escolar, como o momento da alfabetização, ou outros que passam por esse processo sem muitas dificuldades mas no dia-a-dia transmitiram que não vêem muito significado para seu uso.

Mas com outra forma de trabalho se desenvolveram muito bem, como foi o caso da atividade do mosaico, e como pode ser vir a ocorrer em outra forma de trabalho usando com o uso das mãos. Certamente me surpreendi com muitos alunos, que devido as suas limitações em sala, acreditava que teriam muito mais dificuldade no mosaico, e não foi o que ocorreu, tiveram toda a compreensão e assim, o realizaram de forma clara e prazerosa.

Nos encontros dos movimentos de economia solidária, ficam claro que a intenção é realizar uma transformação social, questionando a forma como a economia está organizada e propondo outra maneira de promover o desenvolvimento, com menos concentração de renda e melhor distribuição da riqueza.

Essa ideia de distribuição de renda, quem sabe pode vir a ocorrer com esse grupo da sociedade em um futuro próximo, onde tenham entre eles esses conceitos claros e pessoas que possam investir em seus trabalhos, pessoas que valorizem e acreditem que o que for construído por eles tem o mesmo valor de trabalhos de pessoas sem deficiência, e assim, devem ter o mesmo respeito na economia do mercado.

BIBLIOGRAFIA

CASTRO, A. M. et al. Educação Especial: do querer ao fazer. São Paulo: Avercamp, 2003.
COLL, C. et al. Desenvolvimento psicológico e educação. Porto Alegre: Artmed, 2004.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996
MELLO, S. L. Et al. Economia solidária e autogestão: encontros internacionais – vol. 2. São Paulo: NESOL-USP, ITCP-USP, 2007.
SINGER, Paul. Introdução à Economia Solidária. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2002.
SOUZA, A. M. C. de (ORG.). A Criança Especial: temas médicos, educativos e sociais. São Paulo: Roca, 2003