Economia Solidária: Clubes de Troca Como Instrumento Pedagógico

Autora: Maria Lúcia Barbosa Zemczak
Orientador: Daniel Pansarelli

 

Ao Guilherme, Renée e Alex, pela grande alegria em tê-los como filhos e por me considerarem uma mulher forte e corajosa. Aos meus pais, Eunice e Mário que nunca mediram esforços na educação e formação moral dos filhos. À minha sogra Xênia, que sempre me incentivou. À Dalvanice, Camila e Silvia pelo incentivo e colaboração. À Maria Odete e Valdete, minhas grandes parceiras profissionais e nas quais sempre me inspirei.  

 

SUMÁRIO

  • 1. INTRODUÇÃO
  • 2. ECONOMIA SOLIDÁRIA
    2.1 NOÇÕES DE CAPITALISMO
    2.2 SURGIMENTO DA ECONOMIA SOLIDÁRIA
    2.3 PRINCÍPIOS DA ECONOMIA SOLIDÁRIA PARA PAUL SINGER
    2.3.1 AUTOGESTÃO
    2.3.2 SOLIDARIEDADE
    2.3.3 REPARTIÇÃO DE GANHOS
    2.4 ECONOMIA SOLIDÁRIA SEGUNDO EUCLIDES ANDRÉ MANCE
    2.4.1 SOLIDARIEDADE
    2.4.2 AUTONOMIA
    2.4.3 RESPONSABILIDADE
    2.4.4 LIBERTAÇÃO
    2.4.5 RECIPROCIDADE DA DÁDIVA
    2.4.6 RETRIBUIÇÃO
    2.4.7 EQUIDADE
    2.4.8 SUBSIDIARIEDADE
    2.4.9 DEMOCRACIA
    2.4.10 SUSTENTABILIDADE
  • 3. CLUBE DE TROCA
    3.1 CONCEITO
    3.2 CLUBE DE TROCA COMO INSTRUMENTO PEDAGÓGICO
    3.3 PLANEJAMENTO DAS ATIVIDADES PEDAGÓGICAS
    3.3.1 1ª ATIVIDADE
    3.3.2 2ª ATIVIDADE
  • 4. CONCLUSÃO
  • 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. INTRODUÇÃO

O objetivo do presente estudo é a verificação da utilidade da realização de atividades de clubes de troca como ferramenta pedagógica na Educação de Jovens e Adultos (EJA). Iniciamos com uma breve abordagem dos conceitos de economia solidária e de economia capitalista, para caracterização da diferença entre as duas. Aprofundamos o estudo do conceito de economia solidária, de suas origens até as principais vertentes de pensamento dentro do corpo de conhecimento da mesma.

Explicamos o conceito de clube de troca, sua ligação com a economia solidária e como este se encaixa dentro do contexto dos alunos da Educação de Jovens e Adultos, que em sua maioria são pessoas de baixo poder aquisitivo e que teriam maior benefício com a economia solidária e com o clube de trocas.

Como professora assistente de direção, atuando há seis anos com EJA, na mesma unidade escolar, percebemos que dentre os alunos que frequentam a escola, muitos são pais, tios ou avós das crianças matriculadas no ensino fundamental regular e muitos outros, são ex-alunos do ensino regular.

A seguir, são relatadas duas experiências realizadas numa escola Municipal de Educação Básica de Ensino Fundamental da rede de São Bernardo do Campo, onde também tem o ensino de Educação de Jovens e Adultos atendendo o I Seguimento (Fundamental I) e II Seguimento (Fundamental II). Estão matriculados nessa unidade escolar, aproximadamente quatrocentos alunos compondo duas salas do I Seguimento (uma de Alfabetização e uma de Pós Alfabetização) e doze salas do II Seguimento (duas de quinto termo; três de sexto termo; três de sétimo termo e quatro de oitavo termo).

A idade dos alunos que frequentam a EJA varia de dezesseis a setenta anos, embora a maioria dos alunos estejam na faixa etária de vinte cinco a quarenta e cinco anos. Há um equilíbrio entre homens e mulheres.

A primeira atividade, uma introdução aos professores sobre a economia solidária e os clubes de troca; a segunda é a realização de um clube de troca como um evento de um dia, organizado em uma escola da Rede Municipal de Educação de São Bernardo do Campo com os alunos da Educação de Jovens e Adultos. Conclui-se com o trabalho que a realização de clubes de trocas como prática pedagógica pode trazer resultados satisfatórios no ensino da economia solidária e seus conceitos, bem como pode trazer melhorias para os alunos envolvidos, através das dinâmicas próprias da economia solidária.

 

2. ECONOMIA SOLIDÁRIA

A Economia Solidária é uma forma de produção não capitalista. Segundo Singer (2010), Economia Solidária trata-se de um meio de produção cujos princípios fundamentais são a propriedade coletiva, a autogestão e a sustentabilidade. Existe um contraponto entre a Economia Solidária e o sistema capitalista, é fundamental iniciar este aporte teórico com alguns apontamentos quanto a este último, para em um segundo momento introduzir a ideia da Economia Solidária, e mais adiante, focalizar o clube de troca.

2.1. Noções de Capitalismo

O capitalismo é um sistema econômico que tem como objetivo principal a obtenção do lucro. Ele se baseia na legitimidade dos bens privados e na irrestrita liberdade de comércio e indústria. Etimologicamente, a palavra Capitalismo vem do latim capitalis que vem do proto-indo-europeu kaput, que quer dizer “cabeça”, referindo-se às cabeças de gado, maneira que era medida a riqueza nos tempos antigos.

A economia capitalista é caracterizada pela propriedade privada dos meios de produção e também pela presença de mercados livres de trabalho assalariado. As sociedades atuais possuem economias que são consideradas mistas, pois em geral, há uma mistura de propriedade privada e controles governamentais. Tem como objetivo o lucro proprietário dos meios de produção, e através do trabalho dos assalariados retira a mais-valia que integra o seu negócio. O capitalismo é definido por grande parte da sociedade como um sistema essencialmente econômico, mas o filósofo Karl Marx, defendia a ideia de que o capitalismo é um complexo de instituições político- econômicas que pode determinar as relações sociais, culturais e éticas.

Para entender a ideia de capitalismo, é necessário entender a ideia de trabalho. Desde o início dos tempos até os dias de hoje, ainda não se inventou outra forma de sobreviver que não seja o trabalho para adquirir os bens necessários para a manutenção da vida. O trabalho e as relações que surgem a partir dele vão determinar outras práticas sociais. Apoiamo-nos sobre a concepção marxista no que se refere à relação homem/trabalho e às relações sociais de produção para compreendermos melhor como estas e o mundo do trabalho se constituem.

“O trabalho é um processo de que participam o homem e a natureza, processo em que o ser humano em sua própria ação, impulsiona, regula e controla seu intercâmbio material com a natureza. Defronta-se com a natureza como uma de suas forças. Põe em movimento as forças naturais do seu corpo – braços, pernas, cabeça e mãos – a fim de apropriar-se dos recursos da natureza imprimindo-lhes forma útil a vida humana.” (MARX ,2006, p.211)

As relações sociais de produção são aquelas que o ser humano estabelece à medida que vive em sociedade e produz os bens necessários a sua sobrevivência. As formas como essas relações se constituem caracterizam o que Marx denomina Modo de Produção.

O conjunto dessas relações de produção forma a estrutura econômica da sociedade. A base real na qual se levanta uma superestrutura jurídica e política e à qual correspondem formas sociais determinadas de consciência. (MARX, 1983, p. 23).

O cenário histórico no qual foi concebida a ideia desse sistema econômico também é de suma importância para a compreensão do capitalismo. E foi na Grã Bretanha onde se inicia a primeira Revolução Industrial, esta revolução foi uma transformação nos meios de produção da época vigente. Onde a produção que se concentrava nas mãos dos artesãos transfere-se para as fábricas. Com o surgimento do modo de produção fabril, os camponeses acabaram por serem expulsos dos domínios de seus antigos senhores. Não tendo mais seu trabalho antigo, eles tiveram que rumar para as cidades, para as fábricas, onde eram explorados, adultos e crianças, até o ponto de não serem mais capazes de trabalhar por estarem debilitados fisicamente. Devido a esta exaustão da classe trabalhadora, havia cada vez menos pessoas trabalhando e, conseqüentemente, menos pessoas consumindo.

A Revolução Industrial desapropriou o homem dos meios de produção, constituindo relações de trabalho mecanizadas e alienantes. Codo (1999) lembra: “Até a segunda revolução industrial, com o advento da fábrica, afeto e trabalho viviam em saudável confusão”. Mulheres, homens e crianças trabalhavam diariamente juntos, em condições precárias, nas fábricas ou nas minas de carvão; a relação família/trabalho, barbárie/sofrimento estava muito presente no cotidiano do trabalho ou nos cortiços em que dormiam.

Segundo Singer (2010) “O Capitalismo se tornou dominante há tanto tempo que tendemos a tomá-lo como normal ou natural”. (SINGER, 2010, p.7). Porém, ele é visto como tal por uma questão de falta de perspectiva, e/ou de falta de alternativa. Nesse contexto, entra a economia solidária. Como contraponto à competitividade desenfreada e à dualidade e separação entre capital e mão de obra, a economia solidária prega os conceitos da autogestão, solidariedade e propriedade coletiva.

2.2. Surgimento da Economia Solidária

A Economia Solidária surge na Grã-Bretanha, no cenário da Revolução Industrial e no mesmo momento da Revolução Francesa. Esta última resultou diversos conflitos, inclusive com a Grã-Bretanha, provocando uma grande depressão econômica que provocou um grande desemprego.
Já nesse período, alguns industriais mais esclarecidos começaram a propor leis de proteção aos trabalhadores. Um deles, chamado Robert Owen apresentou um plano ao governo britânico sugerindo que se investisse, com a ajuda financeira do governo, na compra de terras e construção de Aldeias Cooperativas, nas quais os pobres e desempregados viveriam e trabalhariam na terra e em indústrias produzindo sua própria subsistência. O excedente de cada aldeia poderia ser trocado entre as aldeias. Surgia assim um alicerce para o que depois comporia o corpo de princípios da Economia Solidária.

A partir da segunda metade dos anos 70, retorna o desemprego em massa provocando a “desindustrialização dos países centrais e mesmo de países semi desenvolvidos, como o Brasil, eliminando muitos milhões de postos de trabalho formal”. (Singer 2010 p 110).

E é neste contexto em que a Economia Solidária novamente toma forma.

“o foco dos movimentos emancipatórios voltou-se então cada vez mais para a sociedade civil: multiplicam-se as organizações não-governamentais (ONGs) e movimentos de libertação cuja atuação visa preservar o meio ambiente natural, a biodiversidade, o resgate da dignidade humana de grupos oprimidos e discriminados (de que o zapatismo mexicano talvez seja o paradigma) e a promoção de comunidades que por sua própria iniciativa e empenho melhoram suas condições de vida, renovam suas tradições culturais, etc.” (Singer, 2010 p. 112),

2.3. Princípios da Economia Solidária para Paul Singer

Segundo Singer (2010) a economia solidária fundamenta-se nos seguintes princípios:

2.3.1. Autogestão

Talvez a principal diferença entre a economia capitalista e economia solidária esteja na forma em como as empresas são geridas. Na economia capitalista aplica-se a heterogestão, ou seja, uma administração hierárquica onde as informações e consultas fluem de baixo para cima e as ordens e instruções de cima para baixo.

A heterogestão promove a competitividade muitas vezes de maneira desenfreada, sempre procurando formas de extrair o máximo de trabalho e desempenho de seus empregados. Já a empresa solidária se administra de maneira democrática praticando a autogestão.

Quando pequenas tudo é decidido nas assembléias onde todos os empregados participam nas tomadas de decisões. Quando grandes, estabelece-se hierarquias de coordenadores, encarregado ou gestores. Numa empresa autogerida as ordens e instruções devem fluir de baixo para cima e as demandas e informações de cima para baixo.

Podemos dizer que

“a autogestão exige um esforço adicional dos trabalhadores na empresa solidária: além de cumprir as tarefas a seu cargo, cada um deles tem de se preocupar com os problemas gerais da empresa. Esse esforço adicional produz ótimos resultados quando se trata de envidar mais esforços para cumprir prazo, eliminar defeitos de um produto ou para atingir algum outro objetivo que todos desejam. O fato de todos ficarem a par do que está em jogo contribui para a cooperação inteligente dos sócios, sem necessidade de que sejam incentivados por competições para saber quem é o melhor de todos. Mas o esforço adicional torna-se desgastante quando é preciso se envolver em conflitos, tomar partido pró ou contra companheiros, participar de reuniões cansativas, etc.” (Singer 2010 p.19).

2.3.2. Solidariedade

A desigualdade e a competição generalizada não são naturais. Elas são resultantes de como da forma de organização das atividades econômicas, a qual se denomina modo de produção.

Na economia solidária os princípios básicos são a propriedade coletiva e o direito à liberdade individual.

Para Singer, aplicando-se estes princípios o resultado natural é a solidariedade e a igualdade.

2.3.3. Repartição de ganhos

Quanto à repartição de ganhos, no capitalismo, cada funcionário recebe um salário. Este salário varia de acordo com o plano de classificação de cargos, em que cada nível é determinado por critérios objetivos, porém, na realidade, é o ajuste entre oferta e demanda da força de trabalho que determina o valor do salário de cada trabalho (Singer, 2010).

Na empresa solidária, os sócios não recebem salários, mas retiradas, que variam conforme a receita obtida. Se o valor da retirada será igual para todos ou variado, será definido pelos próprios membros da empresa em assembléia.

2.4. Economia Solidária segundo Euclides André Mance

Economia Solidária é uma forma de produção não capitalista onde seus participantes, nas atividades econômicas, cooperam entre si ao invés de competir, predominando assim a igualdade entre seus membros.

Portanto:

“as iniciativas de Economia Solidária têm em comum a igualdade de direitos, de responsabilidades e oportunidades de todos os participantes dos empreendimentos econômicos solidários, o que implica em autogestão, ou seja, a participação democrática com exercício de poder igual para todos, nas decisões, apontando para a superação da contradição entre capital e trabalho.” (Mance 2008 p. 112)

Sob a ótica de Mance (2008) a economia solidária possui uma definição cujos elementos centrais são pautados:

Em Valores, onde o ser o ser humano é sujeito e finalidade da atividade econômica, vivendo num ambiente sustentável e numa sociedade justa.

Na Sustentabilidade e Equidade, a economia solidária privilegia a autogestão, a cooperação o desenvolvimento comunitário e humano a satisfação das necessidades humanas, justiça social, igualdade de gênero, raça, etnia, acesso igualitário à informação, preservação dos recursos naturais e responsabilidade com as gerações futuras.

Na Educação Solidária, há necessidade de transformação na educação. Que a mentalidade da educação atual deixe de ser competitiva e passe a ser educação numa perspectiva solidária, além do que o desenvolvimento esteja comprometido com a sustentabilidade e solidariedade.

Nos Direitos e Responsabilidade, na economia solidária todos têm os mesmos direitos e deveres nos empreendimentos solidários.

Na Organização e Gestão, onde os meios de produção de cada empreendimento e os bens e/ou serviços neles produzidos são de controle, gestão e propriedade coletiva dos participantes do empreendimento. Igualmente há associações, cooperativas e grupos informais de consumidores, pequenos produtores ou prestadores de serviços, individuais ou familiares, que trabalham em separado (cada qual em seu estabelecimento), mas que realizam em comum a compra de seus insumos, a comercialização de seus produtos ou o processamento dos mesmos.

Mance teoriza sob dois aspectos a Economia Solidária

“Desse modo, enquanto alguns acentuam seu caráter de gerar trabalho e renda e de promover a inclusão social (como as iniciativas fomentadas pelas igrejas, por entidades de cooperação e organizações não governamentais): outros, como os movimentos sociais, destacam o seu papel em pressionar por mudanças nas políticas econômicas do país: outros a enfatizam como concepção de desenvolvimento sustentável ou integral, com ênfases nas dimensões ecológicas, subjetivas e espirituais de um modo de vida mais saudável e fraterno: sendo enfim, destacada, por certa parcela de lideranças políticas, como uma alternativa ao capitalismo e aos seus danos sociais e ambientais. Todavia, a economia solidária também é vista, por muitos, como uma espécie de empreendedorismo social, capaz apenas de minimizar os efeitos da exclusão social, sem capacidade de transformação estrutural das sociedades, pois não teria como enfrentar economicamente o poder do grande capital internacional” (Mance, 2008 p.110)

Para Mance (2008) os princípios e valores de economia solidária pautam-se na:

2.4.1. Solidariedade
Todos os seres humanos fazem parte de uma mesma comunidade, onde todos são iguais em direitos e deveres humanos exercidos com ética.

2.4.2. Autonomia

Todos têm direitos e deveres em relação à autonomia, sendo responsáveis por si mesmos no exercício de sua liberdade exercendo-a em função do seu bem-viver, e na promoção da paz entre todos.

2.4.3. Responsabilidade

A humanidade é responsável por cada pessoa e cada indivíduo é responsável por si mesmo e pela humanidade toda. Cabe às pessoas, comunidades, povos e nações, promoverem da melhor maneira possível as liberdades públicas e privadas das pessoas e da humanidade.

2.4.4. Libertação

“Posto que ninguém liberta ninguém, ninguém se liberta sozinho, as pessoas se libertam solidariamente.” (Mance, 2008)

Mance comenta que a libertação só se dá no coletivo e que nunca encontra seu pleno acabamento.

2.4.5. Reciprocidade da dádiva

Devemos reconhecer que mais recebemos da comunidade humana e de todas as gerações que nos antecederam do que retribuímos as gerações futuras e à comunidade. A reciprocidade no exercício da dádiva com autonomia e responsabilidade, alimenta a solidariedade e fomenta a libertação, materializada na atitude de dar de si aos demais porque muito mais já recebemos da comunidade humana.

2.4.6. Retribuição

Para o exercício da dádiva não há retribuição, mas é justo que cada indivíduo seja retribuído pela comunidade por tudo o que faça em promoção do bem-viver das outras pessoas.

2.4.7. Equidade

Equidade tem como sinônimo igualdade, maneira justa.

Mance (2008) defende que ”a retribuição que a humanidade e cada comunidade devem realizar por tudo o que recebem de cada pessoa em particular deve pautar-se pela equidade.”

2.4.8. Subsidiariedade

Somos todos os responsáveis pelo nosso bem-viver e dos demais. Porém se uma pessoa não consegue fazê-lo, a família deverá garantir. Se a família não consegue fazê-lo a comunidade deverá assumir a responsabilidade. Assim sucessivamente até chegar à humanidade. Deve-se paralelamente a isso “expandir as liberdades públicas e privadas de cada pessoa e de toda a humanidade.” (Mance, 2008)

2.4.9. Democracia

Assegura-se a cada pessoa o direito de participar das decisões que afetem a vida de sua comunidade e a sua vida privada, através da expansão do exercício das liberdades (Mance, 2008). Eis que é dado a todo cidadão o direito de participação ativa dentro de sua sociedade, declarando suas necessidades e daqueles com quem convive. A sociedade torna-se democrática quando seus cidadãos são capazes de exercer com responsabilidade e autonomia seus direitos, criando-se regras justas para a conduta do indivíduo em relação à comunidade e vice-versa, pois ninguém se liberta sozinho todos se libertam juntos.

2.4.10. Sustentabilidade

Pertencemos a um grande ecossistema e dele depende nossa sobrevivência. Descobrir caminhos para a manutenção da vida no planeta é dever de todos, portanto, ser sujeito ativo da sociedade e garantir seu direito de voz, respeitando a todos com quem convive, é lembrar-se que vive em sociedade e que se divide espaços e se conquista objetivos que atendam às gerações presentes e futuras.

3. CLUBE DE TROCA

3.1. Conceito

Dentro da economia solidária uma inovação recente são os clubes de troca.

“Eles foram inventados mais ou menos ao mesmo tempo no Canadá e na Argentina, em meados da década de 1980. São em ambos os casos, respostas ao desemprego e à queda da atividade econômica provocada por recessões. Os clubes de troca reúnem pessoas desocupadas que têm possibilidades de oferecer bens ou serviços à venda e precisariam comprar outros bens e serviços, mas não podem fazê-lo porque para poder comprar têm antes de vender e no seu meio não há quem tenha dinheiro para poder comprar sem ter vendido antes. Em outras palavras, a falta de dinheiro inibe a divisão social do trabalho. Estas situações são muito comuns em localidades atingidas por grande perda de empregos.” (Singer 2010 p.105-106)

Com a criação de moeda própria, segundo Singer (2010) o clube de troca gera um mercado que não existia. Esse mercado gera vantagens para todos: os que estavam parados passam a trabalhar e os outros passam a satisfazer suas necessidades. Socialmente também há vantagens porque as pessoas, que há tempo estavam fora do mercado de trabalho, deixam seus isolamentos melhorando, inclusive, os relacionamentos familiares.
Conforme Singer (2010), nos clubes de troca suas transações são registradas e divulgadas aos membros periodicamente dando transparência à vida do clube. Com esses registros a direção do clube consegue detectar e gerenciar os problemas que aparecem nos clubes.

Por isso quando Singer escreve: “Quando o clube cresce e se torna economicamente significativo, comerciantes das imediações tendem a se associar, aceitando a moeda do clube”.

Sob a ótica de Mance os grupos de trocas podem ser de Integração Restrita ou Integração Universal.

Os grupos de trocas de Integração Restrita criam sistemas de intercâmbio restrito entre si, uma conta para cada grupo, uma moeda própria, definindo inclusive um nome para ela. Estipula-se o valor de conversão dessa moeda em Unidades Solidárias de Valor Econômico. Essa moeda não possui lastro, mas tem a capacidade de gerar meios econômicos aos participantes do grupo de troca.

Cada clube do grupo recebe em sua conta um determinado valor e quando um participante quer adquirir um produto de outro grupo, solicita à coordenação e paga com sua moeda social.

A cada mês faz-se o balanço das transações inter-grupos onde apura-se o saldo ou o défict entre todos os participantes.
Dessa maneira, ‘”as moedas sociais emitida em uma comunidade tanto podem ser trocadas por produtos e serviços dessa comunidade, quanto por produtos e serviços oferecidos por grupos de troca em qualquer lugar no mundo. Mas os intercâmbios ficam restritos apenas aos grupos de trocas”. (Mance, 2008 p. 173, 174).

Nos Clubes de Troca de Integração Universal cada clube possui uma conta universal de créditos solidarius, controlada por sua coordenação.
Nesse modelo, o clube pode comprar até o limite de Credito Solidarius que estão anotados em sua conta.

Essa compra se dá na comunidade de intercâmbios, o membro do clube solicita ao coordenador e repassa o valor em moeda social. O coordenador repassa o valor equivalente em Crédito Solidarius ao vendedor que encaminha ao comprador o produto solicitado.

3.2. Clube de troca como instrumento pedagógico

Evidenciar a Economia Solidária como alternativa viável e emergente ao sistema capitalista de produção é a grande temática que perpassa este trabalho. Contudo, pelas limitações evidentes, escolhemos o Clube de Trocas, como principal recorte teórico. Isso porque acreditamos que este pode sanar algumas das principais características que o Capitalismo impõe-nos, causando toda a desigualdade social que presenciamos em nossos dias.
O clube de troca pode ser instrumento pedagógico importante no desenvolvimento de habilidades e competências como organização, cálculos matemáticos, poder de argumentação, oralidade entre outros.

Além disso, o clube de trocas proporciona novos caminhos para sanar “a ameaça que nos atinge, a da negação de nós mesmos como seres humanos submetidos à “fereza” da ética do mercado”. (Paulo Freire p. 128-129).

Por meio de pesquisas bibliográficas indicadas nas referências e outras indicadas pelo orientador, vídeos, documentos, etc.. Atividades de gestão pedagógica que serão anexas ao trabalho, é que buscaremos cumprir o objetivo.

Dentre estas desigualdades, a que mais nos atinge como gestora pedagógica é a questão do desemprego, que desencadeia tantas outras que ficam evidentes no cotidiano da Educação de Jovens e Adultos.

E como o grande motivo de a cada dia mais jovens e adultos procurarem a EJA é a questão profissional, alimentada com a intenção de (re) colocação [1] no mercado de trabalho, percebemos que esta se caracteriza como um lugar privilegiado para uma outra educação, que possibilita um outro mundo. Acentuam-se os problemas quando levamos em consideração que jovens em liberdade assistida [2] são inseridos nesta modalidade escolar como uma nova chance de vida. Além disso, é essencial recordar que ainda nossa cultura é predominantemente machista e as mulheres, portanto, enfrentam grandes desafios familiares e sociais para estudar. Poderíamos continuar citando várias situações que mostram que a EJA está se evidenciando como sanadora de questões que a educação formal não dá conta, como a inclusão de educandos portadores de necessidades especiais, para citar mais um exemplo.

Contudo, é ainda importante citar que a estrutura e importância que a EJA tem na rede de educação municipal é secundária se comparado com a educação formal. Apesar de estarmos buscando caminhos.
Estes motivos e muitos outros justificam a necessidade emergente de refletirmos alternativas pedagógicas que contribuam com a instituição de um novo modo de organização social.

Neste sentido, a EJA se destaca enquanto possibilitadora de novas experiências, justamente por ter como público alvo pessoas que já não estão inseridas no modo de organização social vigente.

O clube de trocas pode auxiliar na reflexão sobre a prática mais valorizada na sociedade atual: o consumo. Considerando que a troca solidária privilegia a utilidade e não o status, esta interessa sobretudo àqueles que não têm condições financeiras para o consumismo imposto e por isso muitas vezes, se veem motivados a consumir a qualquer custo, o que leva à baixa auto-estima, criminalidade, prostituição, etc…

Assim, o clube de trocas pode servir como um elemento pedagógico de interessantes proporções, justamente por atacar o coração do sistema capitalista de produção, observando ainda que, ao participar do clube de troca, o educando estará exercitando vários pontos importantíssimos para seu desenvolvimento educacional, pessoal e social.

 

3.3 PLANEJAMENTO DAS ATIVIDADES PEDAGÓGICAS

Atualmente, numa sociedade capitalista, onde nas últimas décadas, a mídia, patrocinada pelos grandes oligopólios levou a população a uma “onda” de consumismo desenfreado, acreditamos ser importante oferecer aos alunos da EJA outras formas de pensar e adquirir seus bens de consumo.

Para isso, possibilitamos espaços de conhecimento, discussões e vivências de outra forma de sociedade.

Percebe-se que o termo e significado de Economia Solidária são pouco conhecidos para a população na comunidade escolar, tanto para os alunos quanto para os professores.

A educação em Economia Solidária em parte, implica na construção de novas relações entre as pessoas e também com a natureza, onde o Homem é parte integrante dessa natureza.

Esse tipo de educação/formação tem como perspectiva o trabalho-criação onde os sujeitos constroem sua autonomia na relação com o trabalho. Onde esse sujeito tem o controle da produção, administração, distribuição, troca e consumo dos bens produzidos a partir de seu trabalho.

Conforme citado no documento Oficina Nacional de Formação/Educação em Economia Solidária “os processos educativos promovem a construção coletiva de conhecimento e de novas práticas sociais” promovendo assim a redescoberta do sentido do fazer, estimulando a criação de novos valores e ressignificando valores e práticas sociais.

A educação deve ser concebida por meio da ação dialógica e problematizadora. E a autoridade do educador transforma-se em prática pedagógica libertadora, respeitando o outro na sua diversidade.

As discussões sobre Economia Solidária que pretendemos desenvolver com os alunos da EJA possibilitariam trabalhar todos os conteúdos, a metodologia e seus princípios.

PRÁTICAS PEDAGÓGICAS

4. CONCLUSÃO

A utilização do clube de troca como ferramenta pedagógica mostrou-se viável e bem recebida entre professores e alunos da Educação de Jovens e Adultos. Tendo obtido bons resultados neste primeiro momento, continuaremos a incluí-la no planejamento escolar. Sua prática, para a obtenção dos resultados almejados de conscientização e criação de alternativas ao sistema econômico imposto, do qual vivem à margem, necessita ser constantemente realizada e incentivada. O ponto ideal é a autogestão e autossuficiência de um clube de trocas, mas o estudo realizado indica uma abertura e aceitação aos conceitos da economia solidária pelos alunos da Educação de Jovens e Adultos, ou seja, o início do processo.

Estudos complementares poderão ser realizados com o acompanhamento de um clube de trocas criado com alunos da Educação de Jovens e Adultos, do momento em que é criado até a sua emancipação: quando o clube de trocas torna-se autogerido, não necessitando da orientação do corpo escolar para permanecer ativo.

Relatos de novas experiências na implantação de clubes de troca em outros núcleos de Educação de Jovens e Adultos também poderão ampliar o conhecimento obtido através das experiências aqui descritas, bem como relatos das mesmas experiências realizadas nas classes de ensino regular.
Podemos concluir de observações recentes e comentários feitos pelos professores relacionados aos alunos, que após essas atividades os alunos demonstram maior criticidade, estão mais autônomos e mais questionadores.

 

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
KRUPPA, Sônia M. P. Economia Solidária – Uma aproximação ao Programa Supletivo Profissionalizante “Educação dos trabalhadores pelos trabalhadores”. São Paulo, 2008.
MANCE, Euclides André. Constelações Solidarius. Passo Fundo RS: IFIBE, 2008.
MARX, K. Contribuição a critica da economia política. Tradução Maurice Husson. 2ª. Ed. São Paulo: Martins Fontes, 1983.
______. O capital, crítica da economia política. São Paulo: Civilização Brasileira,
2006. Volume I parte III, capítulo VII. São Paulo: Civilização Brasileira, 2006.
MÉSZÁROS, Istvan. A educação para além do capital. São Paulo: Boitempo, 2008.
SINGER, Paul. Introdução à economia solidária. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2010.

 

  1. [1] Lembrando que muitos jovens ainda não entraram neste mercado.
  2. [2]Adolescentes que cometeram infrações penais e estão tentando se reinserir socialmente.